terça-feira, 21 de setembro de 2010

Olhos Bem Fechados


Existe algum sono feliz quando o sonho é uma possibilidade e o despertar, uma certeza? Talvez com um sonho do qual não se acorde, onde o prazer ecoa até o infinito. Um sonho, enfim, ignorante da sua própria natureza efêmera.

Como todo bom sonho. E como todo sonho bom.

domingo, 28 de fevereiro de 2010

Memória Lo-Fi

Quem ainda pensa nos irmãos Mario quando fala de videogame certamente vem perdendo o movimento mais interessante da mídia de entretenimento desse século (até agora, claro). Na noite passada, me deparei com esse trailer de "Kane & Lynch 2: Dog Days":


(Para ver o trailer na janela certa, é só dar uma olhada aqui)

Nada estranho? Cadê o jogo? Como ele é, e como o jogador interage nele? De fato, o trailer nem pode ser mesmo considerado trailer, mas um "teaser"; e o que esse teaser vende é só o aspecto cinemático do jogo. Ele vende só o filme dentro do jogo - e quem não acompanha videogames talvez não tenha idéia do quanto isso vem significando cada vez mais dentro não só da indústria do entretenimento mas até da arte em geral.


Outra coisa: parece contraditório que, à medida em que a tecnologia vem garantindo cada vez mais resolução e mais poder de processamento, seus produtos vêm perseguindo estéticas que remetem às tecnologias do passado. O eixo narrativo de Kane, aqui do trailer, é representado com a estética da Mini-DV, que até há muito pouco tempo era o formato-chave da produção amadora, com pixels aparentes, baixo constraste e grande mobilidade da câmera. Os níveis do áudio da "gravação" estouram a cada tiro disparado. De fato, me lembra a produção de filmes digitais de Michael Mann (o Kane & Lynch original já guardava alguma semelhança com "Fogo Contra Fogo").

Mais importante, o eixo de Kane parece ser ocorrido no passado. E não é de hoje que o cinema (e agora, o videogame) vem utilizando o recurso para diferenciar eixos narrativos diferentes, principalmente aqueles que se referem ao passado. Essa linguagem sugere que a imagem que se forma na cabeça ao lembrarmos do passado é uma imagem lo-fi, com a técnica e a estética do passado. É como se lembrássemos de um filme ocorrido em determinada época, não da experiência real.

Não é mesmo sintomático de um mundo que vem cada vez mais intermediando as experiências de vida através da imagem eletrônica?

quinta-feira, 25 de fevereiro de 2010

Mea Culpa

A Arquidiocese do Rio de Janeiro está processando a Columbia Pictures por mostrar o Cristo Redentor ruindo no filme "2012", de Roland Emmerich. Ela alega o uso indevido de imagem, já que o Cristo se despedaçando seria uma deturpação da fé católica.

Bobagem - ou melhor, bobagens. A primeira está na implicação estapafúrdia da "fé deturpada", uma vez que no filme a destruição do Cristo não tem qualquer implicação religiosa. A segunda, e que funciona como mais um atestado de anacronismo da Igreja Católica, é que a Igreja reclama um direito sobre o uso da imagem do Cristo como se ela fosse a detentora dessa propriedade. Pode até haver algum papel escrito e assinado comprovando essa propriedade, mas não tenho a menor dúvida de que tanto Jesus Cristo é do mundo, quanto o Cristo Redentor é do Brasil - e nenhum dos dois é "da Igreja". E quem está falando aqui é um agnóstico convicto.

Que seja. Na melhor das hipóteses, para a Arquidiocese, a Columbia solta um "mea culpa" e continua recebendo alegremente os royalties do filme - pelos menos o que ainda não foi baixado da internet ou vendido no camelô...

Mais um pouco aqui.

quarta-feira, 17 de fevereiro de 2010

Não Confie nos Arquivos

Não é mesmo estranho que justo o horror seja o gênero que mais vem utilizando a linguagem da câmera-de-arquivo? "A Bruxa de Blair", "Rec", "Cloverfield", "Contatos do 4º Grau"... Parece que o formato de "imagem de arquivo" vem sendo usado como uma forma de emprestar credibilidade ao gênero.

Por mim, tudo bem: gosto da perspectiva de aproximar o horror (e de uma forma mais ampla, o fantástico) do meu mundinho cotidiano, que a cada dia se forma mais e mais da imagem eletrônica. Mas foi justamente com "Atividade Paranormal", certamente o mais simples e mais coerente entre dos "filmes de horror de arquivo", que senti essa credibilidade sofrer um abalo...

Nos momentos em que assusta, "Atividade" é um puta exemplo de "mais por menos". Sombras, ruídos de passos, pequenos objetos que se movem ou apenas o bom e velho silêncio são usados de forma a estimular a imaginação e fazer o espectador achar que vê mais do que está diante da tela.

Mas se por um lado o filme deixa o silêncio e a sugestão correrem soltos para provocar os sultos, por outro fala demais e mostra demais na hora de construir os personagens. Se você quer jogar o jogo da câmera-de-arquivo, precisa seguir suas próprias regras de verossimilhança: qual o sentido de operar uma câmera durante uma discussão de casal? O que esses momentos estariam fazendo numa "montagem feita pela polícia do material encontrado na casa do casal"? Esse é um material interessante para a construção de uma narrativa clássica, mas são coisas que simplesmente não cabem no jogo da "câmera-de-arquivo" - e, pior, sugere uma "naturalidade forçada" que rouba sua credibilidade.

domingo, 7 de fevereiro de 2010

Esses andromedarianos são um perigo!

Um casal de outsiders sequestra o líder de uma grande indústria química. O objetivo: desbaratar o esquema de dominação da Terra promovido pelos Andromedarianos!

Ficção científica? Comédia? Horror? "Save The Green Planet" é tudo isso sem se preocupar em ser nada. É um filme de gêneros sem ser de gênero algum, e sem qualquer medo de desnortear ou assustar o espectador. Quem se dispuser, vai se meter numa das montanhas-russas mais loucas proporcionadas pelo cinema coreano na última década - e quem vem acompanhando os trabalhos de Chan-Wook Park ("Sympathy for Mr. Vengeance", "Oldboy") e Bong Joon Ho ("Memórias de um Assassino" e "The Host") sabe que isso não é pouca coisa...

O trailer pode dar uma boa idéia do que trata, na medida do possível. Confira antes que os andromedarianos destruam tudo!

sábado, 6 de fevereiro de 2010

Aos Humanos o que é dos Humanos

Ver indivíduos fuçando no lixo e chafurdando no gueto que chamam de "lar" não é, racionalmente, uma imagem das mais agradáveis - sobretudo quando eles são impiedosamente esmagados contra a parede pelo Sistema que deveria auxiliá-los. Essa imagem não é nova nem rara, pois vejo na TV todos os dias a ponto de me insensibilizar.

Por isso foi com surpresa que me percebi indignado com a primeira meia hora de "Distrito 9", que reencena em forma de documentário a desocupação de uma favela por um órgão do governo - e o fato de serem alienígenas terrivelmente feios no lugar de qualquer minoria humana não diminuiu em nada minha indignação.

Este é o grande mérito do filme: se valer da ficção científica para fazer um comentário extremamente válido sobre o mundo em que vivemos hoje, cá desse lado da tela. A associação ao apartheid sul-africano ou mesmo aos conflitos entre palestinos e israelenses é praticamente obrigatória aos que mantém um mínimo de contato com o noticiário, mas seus realizadores resgatam a essas imagens o tom de incômodo que a mídia conseguiu banalizar.

Gosto quando um filme faz com que me sinta assim, incomodado/provocado. Mas o gosto ruim que o filme me deixou não vem daí - vem do "efeito Shrek". Explico:

No seu lançamento, "Shrek" foi vendido como um filme anárquico, subversivo até, dada a liberdade que tomava em destruir as convenções dos contos de fadas. Pois eis que, para Shrek se casar e viver feliz para sempre, foi necessário que a princesa, bonita como Cameron Diaz, se transformasse num ogro igual a ele - a mesma dificuldade que o cinema ainda tem de retratar um casal interracial. Falta de coragem para seguir com a "subversão" até suas últimas consequências: eis o "efeito Shrek".

"Distrito 9" consegue manter seu pique durante seu segundo terço, depois que seu protagonista, Wikus Van Der Merhe (escroque, mas gente como a gente) se infecta com um reagente alienígena e passa, ele próprio a se transformar num deles. Mas a partir do momento em que o filme toma a rota da ação, ele começa a perder a fé no seu próprio impacto. Wikus se torna uma espécie de Rambo mutante: um herói incomum, mas ao mesmo tempo tão parecido com tantos outros que conhecemos: ele é O ESCOLHIDO.

Enquanto isso, os pobres alienígenas pobres do Distrito 9 continuam relegados ao segundo plano, ao papel de massa de manobra que deve exercer toda a minoria. Nem mesmo o seu silêncio e sua desagregação é questionado. Incluí-los na solução dos problemas não é uma obrigação dos realizadores do filme, mas ignorar essa possibilidade fez com que um belo desdobramento passasse batido. E não deixa, também, de ser sintomático de uma cultura que delega a responsabilidade da revolução aos HERÓIS solitários - nunca à coletividade. Nada mais humano do que isso.

quinta-feira, 4 de fevereiro de 2010

EM BREVE - Altitude, The Dead e Dream Home

Azarões de respeito ou desperdício de boas idéias? O tempo será o juiz quando estes filmes forem lançados, mas repasso aqui alguns dos trailers que tenho acompanhado ultimamente.



As maiores notícias que ouço sobre esse filme dizem sobre o quão gostosa é a protagonista. Mau sinal. O trailer tem alguns péssimos momentos de "teen movie" - mas quando o que ameaça um grupo de adolescentes em pleno vôo num monomotor é a ausência do solo e uma criatura gigantesca a la Lovecraft, bom... parece que vou ter que acompanhar até o lançamento.




De tão mal montado, o trailer de "The Dead" me recordou aqueles velhos trailers da América Vídeo ("Nossos filmes explodem como DINAMITE!"). Mas o que me chamou mesmo a atenção (além de ser um filme de zumbi africano, coisa que não se vê todo dia) foi aquele velho toque social de George Romero, na sua primeira trilogia dos mortos-vivos. É esperar que "The Dead" venha melhor montado e que traga de brinde esse clima de "Inimigo Meu" que o trailer sugere.




Donos de um cinema que não tem medo de soar não-convencional, os chineses de Hong Kong soltaram um trailer igualmente estranho. Não se intimidem pela lingua cantonesa: é nos planos e na montagem que está o verdadeiro diferencial desse trailer - um slasher sobre um casal que fará de tudo para conseguir a casa dos sonhos. Tudo mesmo.

quarta-feira, 3 de fevereiro de 2010

Dr. Porrada

Por mais que aponte as deficiências (sobretudo morais) no sistema de saúde americano, "Sicko" padece, ele próprio, do narcisismo de Michael Moore. Há algo de errado na América quando planos de saúde desovam pacientes na porta de clínicas públicas - mas também há algo de errado em se levar esses pacientes para um passeio revigorante às margens da prisão da baía de Guantánamo...

Não que Moore invalide seus argumentos com isso, mas ele próprio propõe uma condescendência suicida na medida em que se coloca como (mau) ator de seu próprio teatro - e impõe a todos no mundo o respectivo papel que cada qual deve ter no seu drama.

Não é mesmo uma forma americana de ver o mundo?

http://www.youtube.com/watch?v=8BJyyyRYbSk&feature=related

sábado, 30 de janeiro de 2010

Estaca Zero

Quando o caminho que a gente toma parece não estar direcionado pra lugar nenhum, o melhor a fazer é zerar. Zerar, mesmo. Sem voltar a fita.

Sim, continua sendo um blog sobre as coisas que ando vendo por aí - mas é melhor parar as explicações por aqui. Nada de promessas ou descrições sobre mim ou sobre esse blog. Há um motivo para você ter chegado aqui - e se você chegou, é porque talvez me conheça, ou tenha lido algo que escrevi, ou visto algum filme que fiz.

Tanto faz. Agora que voltamos ao zero, vamos ver onde é que isso vai nos levar dessa vez...